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CAMPO DE CONCENTRAÇÃO NO CEARÁ E A SECA DE 1932

Senador Pompeu, município do interior do Ceará, entre 1915 e 1932, guarda na sua história o episódio emblemático e trágico da construção de um campo de concentração para aprisionar os “flagelados da seca”. O objetivo era único: evitar que os milhares de famintos chegassem a Fortaleza, capital do estado. O campo de concentração de Patu, em Senador Pompeu, na seca de 1918, contabilizou perto de 20 mil retirantes. O Ceará teve oito campos de concentração, sendo sete deles construídos na seca de 1932, a mais terrível de todas. Um levantamento feito pela Universidade Regional do Cariri apontou um total de 73 mil prisioneiros. Um terço da população, na época, morreu de fome e doenças. Meu Pai Luiz Gonzaga, em 1932, tinha 9 anos de idade. Meu avô Batista, o Batista da Light, superintendente da Companhia Light no Nordeste, contava-lhe, tudo, detalhadamente, sobre a seca. Papai Luiz sofria de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC). O medo - incontrolável - de ficar sem água o perseguiu a vida inteira. Lavava as mãos, sempre, depois que estendia a mão e cumprimentava uma pessoa. Em 1970, com medo de uma seca igual a de 1932, construiu no quintal de casa, uma imensa cisterna. Cobriu-a com árvores de sombra, plantas exóticas, bancos e uma pista de dança, com luz negra, churrasqueira e uma pequena copa. Registro duas histórias que “validam” a grande obra faraônica. Hospedou um “gorila” que fugiu de um pequeno zoológico próximo de casa – do Parque Cidade da Criança – que destelhou parte da casa. O gorila foi capturado pelos bombeiros, isso depois de morder o jardineiro e dedilhar, sarcasticamente, as samambaias do jardim. E, em 2005, no episódio do assalto ao Banco Central de Fortaleza, quando ladrões, na escavação do túnel de acesso ao subsolo do banco, deram de cara com a cisterna do engenheiro Luiz Gonzaga. Dizem, não sei se é verdade, que os ladrões chegaram a abrir um buraco na cisterna, que alagou o túnel, atrasando, por alguns dias, o roubo. Em 2015, 10 anos depois, já morando em São Paulo desde 1972, revisitei o passado. As casas, que formavam a Vila Santa Teresinha, da Família Paula, haviam sido demolidas. No local, encontrei um imenso estacionamento de apoio ao Branco Central. Conversei com o responsável pelo estacionamento que, com uma mangueira de jato, lavava o chão do estacionamento. Jogando água fora? Brinquei. “Aqui não falta água nunca!” Foi o que ele me disse. Então, detalhadamente, contei-lhe tudo sobre a cisterna e o tamanho dela. Surpreso, levou-me até a casa das bombas de puxar água da cisterna, perdida, desde então, no meio do estacionamento. Surpresa maior foi encontrar, funcionando a todo vapor, as bombas compradas na J. G. Vieira, do empresário José Guilherme Vieira, amigo da família. Não conheço Senador Pompeu, cidade localizada no centro do estado do Ceará, distante 273 km da Capital, com uma população de aproximadamente 25 mil habitantes. Desconfio que nunca visitarei Senador Pompeu e nem as ruínas do campo de concentração de Patu, que, significa, ironicamente, pequeno cesto para transportar comida, local onde morreram mais de 25 mil cearenses, irmãos de água, dor, fome e sangue.  

João Scortecci