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ERROS E ENGANOS ACONTECEM / JOÃO SCORTECCI

Na semana passada - no final de 2023 - encontrei perdido numa caixa de “cacarecos” o meu exemplar do dicionário Caldas Aulete. Gosto dele. Presente precioso do professor Ézio Grazzi Peluso, do final do século passado. Pena que a letra do impresso é miúda e isso tem dificultado bastante o trabalho de consulta. Hora de comprar uma lupa! Posso estar enganado, mas a compra de uma, fazia parte das resoluções do ano retrasado. Desconfio que esqueci. Erros acontecem, enganos também! Mas o que mata, punge, marca, são os descuidos! Principalmente os da natureza humana. Eles costumam ser - sempre - perigosos, trágicos e mortais! Marcam e destroem vidas. Quanto aos erros, erramos. Quem não erra? O trágico é com o tal do “descuido”. Pisou em falso, cai. Rola, bate a cabeça e morre. Você foi descuidado! E isso não pode acontecer, nunca. Já disse: alguns descuidos são mortais. Quando criança, isso no melhor dos anos 1960, morria de medo de me perder na saída da missa - sempre apinhada de gente - na igreja do Sagrado Coração de Jesus. “Na saída dá a mão para o seu pai e segue o fluxo.” Conselho de todos os domingos, da minha mãe. “Não vá se perder!” Repetia, sempre. Durante a missa “zanzava” pelos bancos e mexia em tudo. Vez por outra me escondia dentro dos confessionários, visitava a sacristia, azucrinava os calos do sacristão. Quando tocava o sinal do ofertório, voltava “santinho” para o meu lugar. Sabia que depois da comunhão o padre daria a benção aos fieis e mandava o povo, aliviado, de volta, para casa. Tinha dez minutos de tempo, no máximo. Num domingo, um gato preto - de miado forte - entrou na igreja e começou a marcar território e a trocar odores comigo. Dei pipoca para o gato e ele gostou da brincadeira. Partilhamos território e carinho. Quando me dei conta o povo já estava deixando a igreja e o gato, assustado, então, escafedeu-se. Corri para pegá-lo, sem sucesso. Vi a mão do meu pai balançando na minha direção e não tive dúvidas: agarrei firme. Já na porta da saída, estranhei aquela mão, o tamanho dela e o tato. Olhei e não reconheci o meu pai. Era de um homem gordo e feio. Tentei puxar a mão, com força. Nada. O homem curvou-se e disse-me, quase sussurrando: “Você vem comigo!”. Eu havia sido descuidado, negligente. Erro imperdoável. O homem me arrastou pela mão e eu não conseguia escapar. Estava cego, hipnotizado. Já descíamos a rampa, na direção da praça, quando escutei um grito: “João, aonde você vai?” Era a minha mãe. O homem soltou a minha mão e disse: ele estava perdido! Rompi a inércia e corri. O homem afastou-se rapidamente e sumiu. Erros e enganos acontecem. Aprendi, desde muito cedo, qual a diferença entre “descuido”, "erro" e "engano". Sinônimos são significados perigosas! Esclarecem tudo e as vezes, nada. 
   
João Scortecci