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CABO DE GUERRA E AS ESTRATÉGIAS DE PAZ / JOÃO SCORTECCI

Nós crianças, de todas as idades - vez por outra - brincamos de “cabo de guerra”. Uma corda grossa, um lenço vermelho amarrado no meio dela, uma linha de pedras pontilhando o chão, dividindo mundos e forças opostas - natureza e homem - lutando entre si, desafios, ideias e incertezas de tempo e vida. Sempre foi assim. O legado de 2023 foi imenso. Sobrevivemos! Não houve prorrogação, VAR e nem pênaltis. Não torço pelo rompimento da corda e nem que um dos lados - aparentemente mais forte - vença a peleja. Somos frágeis! Lembro-me de um cabo de guerra - isso na infância dos anos 1960 - vencido pelas meninas - aparentemente mais fracas - que do nada - estrategicamente, talvez, começaram a rir e fuxicar, no melhor da peleja. Rindo de nós? Certeza que sim. As meninas - belas e sujas de barro - num único puxão - de surpresa - esticaram o cabo e nos jogaram, derrotados, na lama. Queremos revanche! Revanche! Alguém do nosso lado gritou. Chico, o gordo da turma, foi para a cabeça da corda e gritou: agora! Puxem, com força. Durante alguns segundos o equilíbrio foi total, nada se moveu. O lenço vermelho, amarrado no meio da corda, ficou inerte. Olho no lenço: e nada. Foi então que Chico, o gordo, boa praça, começou a peidar fedidos e a soltar mal cheirosos torpedos. Uma artilharia de puns. Barulhentos e mortais. O golpe foi sentido - por todos - de imediato. Guiomar - a primeira da fila das meninas - gritou: Assim não vale! Isso é golpe sujo. E era. Chico gordo estava, literalmente, azedo. Cagadíssimo! E assim foi. A bandeira vermelha, lentamente, veio para o nosso lado e junto: Guiomar, Tereza, Ana, Maria das Graças, Leda e Taninha, a caçula. Ganhamos a revanche. Demos o troco. Depois daquele dia trágico, de fuxicos e puns, a brincadeira de cabo de guerra foi, então, esquecida e o empate, selado. Não foi fácil, depois da vitória, abraçar o Chico, o herói. Fomos - meninos e meninas, todos - nadar nas águas do Rio Pajeu. Que 2024, seja leve. 

João Scortecci