Pesquisar

EU - AINDA - SOU ASSIM

Eu e a liberdade. Nasci passarinho. Gavião, talvez. Agitado e inquieto como um colibri faminto. Iridescente de palavras e secretado de néctar e mel. Joana - minha babá de banho e açúcar - sabia de tudo. Eu era o seu pecado. Sabia dos meus incomuns. Meus espaços. Meu coração de asas bate veloz e vive - inteiro e febril - nas agitações da pele: no toque bruto, frontal e delicado da vida. Tenho sangue tipo B e sei sangrar. Sou vertente polinizada de cera de carnaúba. Sou zangão. Sensível e inquieto. Sou marujo das velas do Mucuripe e Leão. Sou biruta de agulhas, mapas, rotas e bússolas. Um cosedor de palavras e cheiros. Andarilho? Talvez. Meu voo da sorte é de borboleta 13. Das manhãs do sol vertente. Sou ovo, larva, pupa e imago. Sou vento abrasador: queimo e incendeio. Sou cabresto de arraia (pipa, papagaio) que envia telegramas e bilhetes na linha do cerol. Avisos da terra. Foi assim na infância de pitombas, cajás, graviolas e atas. Foi assim na adolescência das danações do corpo e da alma. Foi assim no adulto das coisas, das manias, dos trejeitos e das fatalidades. E agora - sou assim - ainda. Um morcego vampiro. Um pica-pau? Teimoso, talvez. Sou “bicho” vaga-lume. Pirilampo no relógio da noite escura. Sou horas, tempos, sangria: do que sou, ainda. 

João Scortecci