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AMOR VERNAL DE INFÂNCIA

Amor de brincadeiras: de beijos molhados, mãos de dedos entrelaçados, malícia e pureza, de olhos de paixão no coração. Sexo de dedos e cheiros, no batente de pedra do portão de ferro do casarão. Segredos desenhados com carvão no jogo de amarelinhas, bilhetes de papel e silêncios de espera: de goma e raízes. Amor de infância. Vernal. Vez por outra: na inocência das tardes do Pajeu, éramos peixes, das águas de corpo. Igual sapoti doce e seriguela agridoce no céu dos pecados. Espelhos turvos de Carás, mussuns e piabas. Você lembra? Eu que não tinha paciência (precisava?), adorava beliscar o grilo de suas entranhas de moça, de menina de coxas e pernas no cio. O ar tremia junto. Batia asas de chuva, orvalho e perfume. Primeiro no balanço da goiabeira do quintal, depois, na cola do muro do vizinho dos fundos e por fim: na despensa, na casa das farinhas, no encosto do saco de batatas, de arroz e feijão de corda, no açoite de cabelos negros e longos, no suor do calor e do sol do amor. Pingos de terra e leite. Éramos passarinhos de nós. Leves e livres. Você lembra? No encontro de morte - última vez - você, então, confessou-me tudo: Lembro. Sou a memória de tudo! Fui o primeiro gozo, o beijo aprendiz da tua boca, o ensinamento do meu toque, o abraço do teu coração. Eu lembro. E a morte, então, chegou de vez. Revelou-se: Eu sou o gozo da tua alma. Precisava? Quis saber. E a morte, então, sorriu. Fechou o portão de ferro do casarão e partiu em silêncio.       

João Scortecci