O francês Charles Paillasson (1718 – 1789) foi mestre calígrafo da Comunidade de Mestres Escritores, um tipo de profissional que, no Antigo Regime – período da história francesa que corresponde ao reinado da Casa de Bourbon, desde a ascensão ao trono de Henrique IV, em 1589, até à Revolução Francesa, em 1791 – assumiu a função de escrever bem e ensinar essa arte. Nos séculos XVI e XVII, os mestres escritores se agruparam em corporações na França e Países Baixos Espanhóis (atuais Países Baixos, Bélgica, Luxemburgo e parte do norte da França). No livro “A escrita memória dos homens”, do poeta e ensaísta francês George Jean (1920 – 2011), no capítulo “A eterna sabedoria da mão com a pena”, na página 114, é citado o seguinte trecho da obra “A arte de escrever” (“L’art d’écrire”), de Charles Paillasson, de 1763: “A primeira posição é a que se chama ‘de frente’, porque a pena é segurada quase frente a frente ao corpo, e de maneira a que ela produza sobre a linha perpendicular ou sobre a oblíqua grossos em gradação descendente. A segunda posição é ‘de lado’, pois a pena é segurada de maneira a que o bico fique na direção da linha horizontal para produzir os grossos na citada linha, assim como também acima e abaixo das partes curvas. A terceira posição é chamada ‘inversa’, porque a pena, da maneira que é segurada, produz grossos ascendentes.” Fiz o teste: funciona! Afora a aula, interessante e prática, sobre “A eterna sabedoria da mão com a pena”, pude observar no texto – repetidas vezes – o uso da palavra “grossos”. Pesquisei, reli o capítulo, sem sucesso. Nada sobre “grossos”, além de: plural de grosso, diâmetro considerável, que tem grande espessura, encorpado, corpulento, volumoso e grosseiro. Considerando – tudo é possível – um descuido de tradução, encontrei depois outra acepção para a palavra francesa "grosse", que, no campo da caligrafia e tipografia, significa letra bastarda, indicando mistura de letra formal e escrita cursiva comum, produzida com traço forte e grosso. Foi o que “entendi” quando li, pela primeira vez: traços grossos! Pena que a pena penou! Trocadilho? Talvez. Não resisti. Perdão!
João Scortecci
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