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RAFAEL, O ANJO NEGRO

Quando o Imperador Pedro I (1798 – 1834) partiu do Brasil de regresso a Portugal, após abdicar do trono, em 1831, deixou Rafael, o “Anjo Negro”, como um dos responsáveis pela guarda e segu-rança do menino Pedro, "o Magnânimo", herdeiro da Coroa portu-guesa, e na época com apenas cinco anos de idade. O imperador nomeou José Bonifácio de Andrada e Silva, como tutor, e Dadama (Mariana Carlota de Verna Magalhães Coutinho), Condessa de Belmonte, como uma espécie de mãe postiça do menino Pedro. Em 1826, quando ele tinha um ano de idade, sua mãe, a Imperatriz Consorte Dona Leopoldina, morreu poucos dias após dar à luz um menino natimorto. Rafael, veterano da Guerra da Cisplatina – con-flito ocorrido entre o Império do Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata, no período de 1825 a 1828, pela posse da Província Cisplatina –, era pessoa de confiança do imperador e na época, a seu mando, foi empregado no Paço do Palácio Imperial de São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Rafael – o “Negro da Quinta Imperi-al” – acompanhou Pedro II até o dia em que o monarca foi deposto e preso. Soube da proclamação da República (15 de novembro de 1889) no dia seguinte, da boca do Raposo (Inácio Augusto Raposo), bibliotecário do Paço Imperial de São Cristóvão: “Seu Raposo, você enlouqueceu?” Raposo, enlouquecido, bradou: “Rafael, tu não sabes que ontem foi proclamada a República e que teu ‘menino’ está preso no Paço da Cidade?” Rafael levantou o braço direito para o céu e exclamou com voz comovente e sonora: “Que a maldição de Deus caia sobre a cabeça dos algozes do meu menino!” Em seguida, rolou por terra: estava morto. Tinha 98 anos de idade. Lendo a biografia de Pedro II, descobri duas coisas que até então não sabia: por parte de mãe, o imperador era sobrinho de Napoleão Bonaparte; e durante a sua infância – solitária e de abandono – havia um grupo de políticos “palacianos”, conhecido como “Clube da Joana” (“Facção Áulica”), que, segundo consta, era liderado por Aureliano de Sousa e Oliveira Coutinho, político conservador que exercia forte influência sobre Dom Pedro II. A Facção Áulica realizava frequentes reuniões na residência de Paulo Barbosa Silva (1790 – 1868), mordomo da Casa Imperial, situada nas proximidades da Quinta da Boa Vista e do Rio Joana. Essa é a provável origem da expressão "Casa da Joana". Lendo, ainda, sobre a biografia do mordomo, soube tratar-se de um deputado da cidade de Sabará, pela então província de Minas Gerais, e de sua participação decisiva na fundação da cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro, conhecida como Cidade Imperial. Aqui – já concluindo – cabem as máximas: “O mordomo é sempre o culpado”; e, coincidência ou não, a ex-pressão “Casa da Mãe Joana” – que significa lugar ou situação onde vale tudo, sem ordem, onde predomina a confusão, balbúrdia e desorganização – em nada se refere ou faz lembrar o Clube da Joa-na, lá do Rio Joana, da Quinta da Boa Vista. Muito menos traz à memória traços do palácio dos soberanos da Áulica de hoje.

João Scortecci