Pesquisar

MOACYR FRANCO, GUTO E O MUSSUM PRETO DO RIO PAJEÚ

Nos anos 1960 – na infância revisitada em Fortaleza, CE – fui Lobinho, da Matilha Amarela, do Colégio Cearense Sagrado Coração de Jesus. No ano de 1966 – data a ser confirmada – o ator, diretor e compositor Guto Franco (Paulo Augusto Franco), filho do cantor e compositor Moacyr Franco, estava no auge de sua “precoce” carreira artística. Juntos, Guto e Moacyr lotavam shows Brasil afora. Todo mundo queria ver de perto o menino gênio. Uma febre! Guto, na época, deveria ter, então, sete anos de idade, no máximo. Alguém – não lembro quem – soprou com a conversa de que o menino Guto - também - era um Lobinho. Seria verdade? Por diversas vezes - nos últimos anos - tentei confirmar a veracidade da informação, sem sucesso. A notícia de que Moacyr e Guto estariam apresentando-se no Clube América – localizado, na época, na Avenida Dom Manuel, entre as ruas Pero Coelho e Pinto Madeira, centro, Fortaleza, CE – mexeu com o coração da matilha de lobos. O Clube América não existe mais. nesse endereço. O prédio foi demolido. No local foi construído um conjunto habitacional, algo assim. Fomos ao show – na cara de pau -, vinte e poucos lobos, uniformizados e pilhados. Moacyr – foi o que nos disseram, na ocasião – autorizou nossa entrada, “na faixa”. Deu-nos, ainda, lugar especial no show: sentados, no chão, de frente para o palco. Ana Maria Macedo e Gláucia Bomfim, Aquelás, vigiavam a matilha, numa missão – quase – impossível. Moacyr, Guto e músicos entraram por um buraco feito de improviso no muro de divisa entre o ginásio – uma quadra esportiva descoberta – e a mansão da família do Zequinha Napoleão, onde, todas as tardes, na companhia do seu filho, Zé Napoleão, jogávamos futebol. O show começou com Moacyr cantando vários sucessos. Voz maravilhosa. Guto permaneceu sentado numa cadeira, na ponta do palco. Depois de meia hora de show, o público começou a gritar “Guto, Guto, Guto”, pedindo por ele, insistentemente. A gritaria tomou conta do povo e Moacyr, então, não conseguiu mais cantar. Aborreceu-se. Começaram as vaias, e a situação saiu do controle. Moacyr, então, parou de cantar e sinalizou para que a banda também parasse. Vaias. Muitas vaias. Moacyr, educadamente, aguardou o silêncio. Foram segundos – de espera – eternos. O silêncio veio aos poucos, e o público, então, calou-se, de vez. “Posso continuar?”, indagou. Palmas. Muitas palmas. “Faltam três canções – explicou – e somente depois delas o Guto fará a sua apresentação”. "Combinado?" Mais palmas. Moacyr – serenamente – continuou. Guto foi finalmente apresentado. Levantou-se da cadeira – parecia assustado – e cantou duas ou três músicas. Não mais do que isso. Moacyr, então, agradeceu e encerrou o espetáculo. Saíram pelo buraco do muro. O buraco – portal de lembranças – permaneceu aberto por um bom tempo, protegido por um tapume de madeira. A mansão do Zequinha – é o que eu fiquei sabendo depois – serviu de camarim para a dupla. Fora construída sobre o Rio Pajeú, hoje canalizado. Lá – nas águas do Pajeú – cacei e pesquei calangos, tijubinas, ratos-do-mato, carás e mussum preto. Sou fã do Moacyr! Tive o prazer de conhecê-lo pessoalmente no ano de 2014, já na cidade de São Paulo, num evento do Clube Palmeiras, quando cantou a canção "O Amor é Verde", em homenagem ao nosso time do coração. 

João Scortecci