Santo Amaro – hoje distrito da região metropolitana da cidade de São Paulo – foi município independente de 1832 até 1935, quando foi reincorporado à capital paulista (Decreto n. 6.983). Até à promulgação da Lei Provincial n. 33, de 1877, incluía as áreas dos atuais municípios de Itapecerica da Serra, Embu das Artes, Embu-Guaçu, Taboão da Serra, São Lourenço da Serra e Juquitiba. A expansão de Santo Amaro começou no século XIX, mais precisamente em 1827, quando recebeu o primeiro grupo de imigrantes alemães que desembarcaram da Galera Holandesa "Maria", no porto de Santos; o segundo grupo desses imigrantes ali chegou no século XX, entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. A origem da região de Santo Amaro está ligada a uma aldeia indígena à margem do rio Jeribatiba, que, em 1950, foi nomeado oficialmente como “Pinheiros”. Assim como o rio, o bairro teve diferentes nomes: “Virapuera”, “Jeribatiba”, “Ibirapuera”, “Santo Amaro de Virapuera” e finalmente “Santo Amaro”. De origem cristã, esse é o nome de um santo nascido em 513 d.C., na Itália, e identificado como protetor dos carroceiros, carregadores e fabricantes de velas. A região passou a ser conhecida como “Santo Amaro” depois que o Padre José de Anchieta (1534-1597) rezou uma missa com a imagem do santo, à margem do rio Jeribatiba. Santo Amaro é também o local de nascimento do poeta e dramaturgo Paulo Eiró (Paulo Emilio de Salles Chagas Eiró, 1836-1871), que morreu jovem, desiludido e depressivo, com apenas 35 anos de idade. Assim como muitos poetas do século XIX, ele tinha uma musa inspiradora – sua prima, Cherubina Angélica de Salles, um amor escondido e impossível. Quando ela se casou com um desconhecido, o poeta entrou em depressão e adoeceu. Mudou-se, então, para a cidade de São Paulo, para estudar Direito na Faculdade do Largo do São Francisco, e morar, de favor, no Seminário Episcopal de São Paulo, no bairro da Luz. Enlouquecido – com crises de depressão cada vez mais constantes – e sem vocação religiosa, abandonou os estudos e voltou para Santo Amaro, por recomendação do diretor do Seminário, que também aconselhou seu pai, Francisco Antonio das Chagas – professor conhecido na região como “Chico Doce” – a destruir o caderno de poesias do filho, como solução e cura para sua loucura. Quando do casamento da sua musa, Paulo Eiró escreveu o soneto “Fatalidade”, um de seus poemas mais conhecidos: “Que vista! O sangue se afervora e escalda! / Por que impulso fatal fui hoje à igreja? / Quer meu destino que, ao entrar, lá veja / Noiva gentil de cândida grinalda. / Nos olhos sem iguais, cor de esmeralda,/ Lume de estrelas, plácido, lampeja:/ Seu branco seio de ventura arqueja; / Louros cabelos rolam-lhe da espalda. / Hora de perdição! Sim, adorei-a; / Não tive horror, não tive sequer medo / De cobiçar uma mulher alheia. / Unem as mãos; o órgão reboa ledo; / Em alvas espirais, o incenso ondeia.../ E eu só, longe do altar, choro em segredo!” Com a saúde cada vez mais frágil, foi internado no Hospício dos Alienados, na cidade de São Paulo. Morreu no dia 27 de junho de 1871, vítima de meningite. Em março de 1957, foi inaugurado, em sua homenagem, o Teatro Paulo Eiró, no bairro de Santo Amaro. Foi lá – nos anos 1980 – que escrevi o poema-livro “Luanda - Uma bailarina morta”, ao saber da morte – por atropelamento, numa das esquinas do teatro – de uma jovem bailarina, que carregava nos braços um par de sapatilhas. Mais recentemente, dois ou três meses antes do surto da covid-19, recebi na editora o amigo e jornalista Henrique Novak, com um livro sobre Paulo Eiró: biografia e poesias inéditas – até então “perdidas” – e salvas do fogaréu da ignorância. Quem as guardou? Para publicá-lo, dependia de autorização de alguém, possivelmente um parente do poeta ou algo assim. Aguardo – ansioso – o seu retorno e a obra para publicação, ainda em 2022. Henrique Novak – para quem não o conhece – foi, nos anos 1980, jornalista da seção “Página do Livro”, do jornal “Diário Popular” (SP), a quem nós, aqueles então jovens poetas e escritores, seremos eternamente gratos pelo espaço e apoio incondicional.
02.05.2022