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CHIQUINHA GONZAGA, NAIR DE TEFFÉ, RUY BARBOSA E O ESCÂNDALO DO “ENFIAR O PÉ NO JACÁ”

“Jaqueira” é uma árvore tropical de grande porte, pertencente à família das Moraceae, nativa da Índia e cultivada principalmente na Ásia e no Brasil. Produz o maior de todos os frutos comestíveis: a jaca. A expressão popular “enfiar o pé na jaca” nada tem a ver com a fruta e com as jaqueiras, mas com uma espécie de cesto – de nome “jacá” – feito de bambu ou cipó, usado preso ao lombo de animais para o transporte de mercadorias. Não se sabe – não encontrei na minha pesquisa, perdão – quando o acento agudo desapareceu da expressão. Escafedeu-se! Existem outros casos de adágios bastante conhecidos: “Batatinha quando nasce espalha a rama pelo chão”, “Quem não tem cão, caça como gato” e outros. “Enfiar o pé na jaca” significa cometer excessos, beber muito, exagerar na dose! Os condutores desses animais – conhecidos como “tropeiros” – ao longo de suas viagens, paravam para beber. Quando bêbados – vez por outra ou quase sempre, tanto faz –, ao tentarem subir nas montarias, acabavam enfiando o pé no jacá. É também sem acento agudo que ficou conhecido o escândalo político do “Corta-jaca”, que aconteceu no dia 26 de outubro de 1914, no palácio do Catete, no Rio de Janeiro, sede do governo federal. Na presença de diplomatas e da elite carioca, o tango “Gaúcho” – popularmente conhecido como “Corta-jaca” –, da compositora, instrumentista e maestrina Chiquinha Gonzaga (Francisca Edwiges Neves Gonzaga, 1847-1935), foi executado pela pintora, cantora, pianista e primeira-dama Nair de Teffé (1886-1981), esposa do então Presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca. O poeta, teatrólogo, músico e compositor maranhense Catulo da Paixão Cearense (1863-1946), amigo do marechal, havia observado que, nas festas palacianas, nunca se executava música nacional. Era, portanto, a primeira vez que esse tipo de música penetrava nos salões elegantes da elite, fazendo com que o fato seja considerado a alforria da música popular brasileira. E foi por sugestão de seu professor de violão, Emilio Pereira, que Nair de Teffé executou o tango “Corta-Jaca”, de Chiquinha Gonzaga. No dia seguinte, em sessão do Senado Federal, o senador Ruy Barbosa (1849-1923), adversário político do Presidente da República, comentou o acontecido: “Por que, Sr. Presidente, quem é o culpado, se os jornais, as caricaturas e os moços acadêmicos aludem ao Corta-Jaca? (...) A mais baixa, a mais chula, a mais grosseira de todas as danças selvagens, a irmã gêmea do batuque do cateretê e do samba (...)”. Até tu, Ruy! Aqui cabe o adágio – às avessas, claro: “Vale mais uma hora de tolo que a vida inteira de sábio.”

24.04.2022