Todo gato doméstico tem um nome. A minha doce e sensível gata – ex-moradora de rua –chamava-se “Gatinha”. Acho que gostava do nome: nunca reclamou. Era mãe do Preto Garbo, um gato grande, branco e preto, que, quando saía para namorar, voltava todo arrebentado. Um dia, não voltou. Gatinha ficou. Foi colaboradora da editora durante muitos anos. Era manhosa e esperta. Independente. Assim são os gatos! Existem cerca de 250 raças de gato doméstico – “Felis silvestris catus”. São predadores de diversos animais, como roedores, pássaros, lagartixas e insetos. Vez por outra, Gatinha trazia de presente um pardal morto ou uma lagartixa. Jogava a caça em cima da minha mesa de trabalho e cobrava carinho e atenção. Gatinha não aceitava desaforos. Quando ignorada, subia na mesa e, com o rabo, jogava no chão a minha papelada de editor. Segundo pesquisas, gatos são o segundo animal de estimação mais popular do mundo, depois – numericamente – dos peixes de aquário. Isso eu não sabia. Sempre pensei que fossem os cachorros. A chegada de um camundongo na editora, batizado de Edgar Allan Poe, mudou tudo. O sossego acabou. Gatinha perseguiu o pequeno roedor e o pegou enfiado no ralo do banheiro. Levou-o até a minha sala e o soltou encurralado num canto. Ela me olhou e sorriu. Fez-me lembrar da foto do gato do restaurante O Gato que Ri, casa de massas do Largo do Arouche, na cidade de São Paulo, o qual frequentei semanalmente nos anos 1970. Gatinha cheirou Poe, sentou-se, cruzou as patas da frente e enamorou-se pelo poeta e seus encantos. A editora inteira olhando, admirando a trama poética. Poe balançou a cabeça, para cima, para baixo, para os lados e se aninhou de amor nas patas da Gatinha. Desarmei a ratoeira – a pedido da Gatinha – e montei na lavanderia dos fundos um quarto de dormir para o par. Depois de alguns meses, gordo e feliz, Poe sumiu. Penso ter visto numa noite escura e sombria – enquanto eu escrevia – um corvo no muro do quintal. Desconfio que Edgar Allan Poe foi levado deste mundo. Gatinha – entristecida – nunca mais foi a mesma. Viveu, ainda, mais alguns meses. Só isso e nada mais.
João Scortecci