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O HOMEM QUE TINHA UM CANHÃO NO QUINTAL

Serafim tinha um canhão do quintal da sua casa. Canhão de verdade? Claro! Ironizava, sempre: não sou de brincar com fogo! Foi Oswald de Andrade - o moço Antropófago - que me apresentou o homem-livre e irônico de nome Serafim Ponte Grande. Isso durante a Revolta Paulista de 1924. Segundo Oswald, Serafim - personagem protagonista do livro de mesmo nome - é herói “enrugado” que tende ao anarquismo. Serafim, na história de Oswald é funcionário federal. Casado e com filhos. Casou-se obrigado. Gostava de dizer que seu casamento havia sido um engano de “sensualismo virtuoso” posto no sofá da adolescência. A obra - primeira parte - narra sua infância e adolescência até sua união com a poderosa Lalá - a mulher que o obrigou a se casar. Pano de fundo da história: a Revolução Paulista de 1924. Lendo sobre a obra descobri que Serafim era um transgressor esperto. Um engodo. Um anarquista enrugado, segundo Oswald. Desfecho modernista do enredo: Serafim rouba o dinheiro que os revolucionários haviam deixado com um dos seus filhos, mata o seu chefe e foge para a Europa em um transatlântico. Fim. Destino de Serafim? Talvez Paris, eldorado modernista. Serafim Ponte Grande reaparece - do nada - nos anos 40, nas crônicas satíricas e críticas do jornalista Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Marcus Rangel Porto, 1923 - 1968) e na parceria de sucesso com o ilustrador e pintor Santa Rosa (Tomás Santa Rosa, 1909 - 1956). Tudo isso para “redizer” que Serafim - homem livre de cabeça e ideias - guardava um canhão no quintal da sua casa, sobra bélica da Revolta Paulista de 1924. Cena antropofágica: A capital Paulista foi palco de um conflito urbano com explosões de bombas, moradias e prédios destruídos, bombardeios por aviões, soldados com metralhadoras, população em fuga, tanques de guerra e trincheiras abertas nas ruas. Nota do front: Lalá, mulher de Serafim, sobreviveu a tudo e a todos. Ficou rica e foi morar em Copacabana. Fim.

João Scortecci