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O POEMA DE ANALECTOS!

O moço tinha nome. Chamava-se José Analectos. Filho único de pais professores, já falecidos, do interior do estado de São Paulo. Vivia solitário no pequeno apartamento no bairro de Moema, que dividia com um jovem casal da cidade de Mairiporã, região metropolitana da capital paulista. Trabalhava no comércio de peças de carros, algo assim. Tímido e reservado, na casa dos 30 anos de idade, estava interessado em publicar um poema. “Analectos?” Ele me olhou e respondeu: “Analectos: plural de antologia, coleção de máximas, seleta, textos escolhidos tirados de obras de um ou vários autores. Quando nasci, meu pai – Versino – abriu o dicionário e apontou, de pronto, o meu nome: ‘Analectos!’ Sua mãe se chamava Ana e seu pai, José. Virei, então, o José Analectos.” Interessante, pensei. Analectos havia escrito um poema intitulado “Benevolência” – com 12 versos – e queria publicá-lo na antologia anual da Scortecci Editora. “Vou precisar de outro poema e também de uma pequena biografia sua, de 10 linhas, no máximo. Temos de ocupar duas páginas.” Analectos, então, perguntou-me: “Outro poema?" “Sim.” “Não tenho outro poema!” “Não? Então escreve outro!”, sugeri. “Melhor não.” “Não?” “Não. Eu levei alguns anos escrevendo ‘Benevolência’”, justificou. “Anos? Puxa!” “E quando vai ser, então, a próxima antologia da casa?” “Em 2023, no mês de agosto, no evento de aniversário de 41 anos da editora.” “Até lá, quem sabe, escrevo outro poema.” Despediu-se e foi embora. Até outro dia – isso depois de 50 anos no negócio do livro – nunca tinha visto um analecto com um único poema! Fazendo busca na Internet, encontrei nota sobre o livro “Os Analectos”, de Confúcio (551 – 479 a.C.), também conhecido como “Diálogos de Confúcio”, seleta de textos que constituem o livro doutrinal do confucionismo. A obra, ao longo do tempo, foi tão lida na China quanto a Bíblia, no Ocidente. “Os Analectos” é composto de 20 ou 22 livros em que se abordam as virtudes, ensinamentos morais e qualificações como a benevolência, que Confúcio considerava a qualidade mais importante de uma pessoa. Lendo, especificamente, sobre o significado de “benevolência”, qualidade de alguém que demonstra afeto e estima em relação a outra pessoa, decidi-me por dar uma oportunidade – quebrando todas as regras da casa – para que o moço publique apenas um poema na antologia. Aguardo, então, que José Analectos retorne com “Benevolência”, trazendo – ou não – outro poema seu.